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quinta-feira, julho 15, 2010



Desespero. O verdadeiro medo possui uma característica aterradora. Solapa todas as nossas preciosas ignorâncias e estabelece a mais cruel percepção de nós mesmos. A mãe de todos os tipos de consciência, aquela que está para além das mentiras que contamos para suportar nossos fracassos cotidianos; que zomba dos edifícios metafísicos que criam fachadas de eternidade ante o fim iminente que se avizinha a cada piscar de olhos; que escarneia da autoestima de alcova, aquela que forjamos ante o espelho embaçado de cada manhã e que mantemos intacta graças aos adágios e elogios de gaveta que nos lançam por aí. O desespero impõe a visão lúcida acerca de si mesmo, sem subterfúgios, sem deuses. Sozinhos ante o que de fato somos. Obrigados a nos olhar, desnudos de razão, poesia e luxúria. O nosso corpo em sua profusão de defeitos despejado sobre nós, como um amante inoportuno que ousou permanecer ao nosso lado mesmo tendo passado a embriaguez. Cada sulco indesejado. Cada cicatriz que deixou de esculpir memória em nossa pele. Cada pedaço exasperado de saudade pelo toque que já se foi, mas que permanece ali sob a triste forma de um arrepio póstumo. Membro amputado, fantasma que está não-estando. Desespero, somente desespero...